Concurso Público Nacional de Arquitetura . 2023
“o espaço como um conjunto de fixos e fluxos. Os elementos fixos, fixados em cada lugar, permitem ações que modificam o próprio lugar, fluxos novos ou renovados que recriam as condições ambientais e as condições sociais, e redefinem cada lugar. Os fluxos são um resultado direto ou indireto das ações e atravessam ou se instalam nos fixos, modificando a sua significação e o seu valor, ao mesmo tempo em que, também, se modificam.”
(…)
“o espaço é formado por um conjunto indissociável, solidário e também contraditório, de sistemas de objetos e sistemas de ações, não considerados isoladamente, mas como um quadro único no qual a história se dá”
Milton Santos, A Natureza do Espaço.
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a livre condição labiríntica da feira
“ [a condição de Patrimônio Imaterial da Feira de Campina Grande está relacionada] à territorialidade da Feira, à configuração de suas ruas, seus vãos, seus becos, seus edifícios, seu mercado, enfim, à paisagem histórica urbana acumulada pelas relações estabelecidas entre feirantes e entre feirantes e fregueses, que acabava revelando a todos a “livre” organização labiríntica da Feira Central.”
(Dossiê de Registro da Feira de Campina Grande. IPHAN, 2017)
propõe-se uma arquitetura como expressão da diversidade, do colorido e da configuração labiríntica da feira: sistemas de ações e de objetos que se adaptem às imprevisibilidades de sua dinâmica social, cultural e econômica:
o sistema de ações é a dinâmica da feira, as relações sociais, a memória, o patrimônio imaterial, ao mesmo tempo vida presente e memória.
o sistema de objetos é o conjunto de elementos de estrutura e de infraestrutura, estáticos ou dinâmicos, de pequeno ou grande porte, que são suporte ao sistema de ações.
neste projeto, propõe-se que a dinâmica imaterial da feira – o sistema de ações seja o elemento definidor da configuração material dos suportes – o sistema de objetos.
a feira é um conjunto dinâmico, rico e complexo de fluxos e fixos, que resulta da interação de elementos simples e diversos.
propõe, neste projeto, que a riqueza e a complexidade do todo seja a expressão da diversidade, da simplicidade e da dinâmica de cada componente individual.
premissas da proposta
- evidenciar a feira, enquanto dinâmica social, cultural e espacial;
- adaptar a materialidade dos suportes de acordo com a dinâmica da expressão imaterial da feira;
- preservar as características, a quantidade, a diversidade e a localização dos pontos de venda atuais;
- recuperar a imagem histórica da feira, em que a efemeridade das barracas marca a paisagem do largo do pau do meio;
- projetar a arquitetura e o desenho urbano como suportes, e não como protagonistas;
- evitar estratégias reducionistas de higienização e respeitar a complexidade, a diversidade e a dinâmica que caracterizam a Feira
- implantar elementos de infraestrutura urbana que dêem suporte à dinâmica da feira e da cidade.
patrimônio
o registro da Feira de Campina Grande como Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil, pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) em 2017, alerta para a necessidade de inclusão da “Área de Preservação do Entorno da Feira” como parte da “Área de Preservação Rigorosa” de Campina Grande. parte-se da premissa de que a preservação e proteção da materialidade (tipologia urbana, usos, edifícios de interesse histórico e cultural) é uma estratégia importante para a salvaguarda da Feira enquanto patrimônio imaterial.
expressão local de uma cultura universal
a feira de campina grande é a expressão local de uma cultura universal: o mercado de rua. são aglomerações urbanas, sob estruturas aparentemente frágeis e flexíveis, porém ao mesmo tempo resilientes, duradouras e diversas.
seja na jemaa el fna em marraquexe, ou na chatuchak em bangkok, notam-se os mesmos elementos dessa cultura universal: diversidade de cores e cheiros, labirintos de barracas e becos, encontros de grupos sociais e étnicos diversos, imprevisibilidades.
mobilidade
o espaço labiríntico e denso da feira é o lugar das pessoas, do caminhar. admite-se a presença de bicicletas (serão reservados espaços de paraciclos em todas as ruas da feira) e de carrinhos não motorizados para o abastecimento e o transporte de cargas de feirantes e fregueses.
veículos motorizados, como motos e carros, devem ser evitados nas ruas internas da feira. a fim de compensar a ausência de espaços de estacionamentos na área da feira e reforçar a vocação das ruas e largos para as pessoas, com a limitação do fluxo de veículos motorizados individuais, propõe-se um sistema de estacionamento satélite, a ser implantado no “parque do povo”, que será conectado à feira por meio de transporte coletivo circular e gratuito, de alta frequência.
o trajeto de 1,6 km, entre a feira e o parque do povo, será percorrido pelo transporte complementar em menos de 5 minutos e permitirá a redução da presença de veículos motorizados no entorno da feira.
unidades de apoio
(armazenamento, sanitários, áreas de descanso com redários, áreas de apoio ao feirante e habitação de interesse social)
a rua é o lugar da feira, da interação entre feirantes e fregueses. com o objetivo de ampliar e qualificar os espaços das unidades de venda da feira, propõe-se que as áreas de armazenamento sejam localizadas – prioritariamente – em unidades de apoio, fora da área das ruas.
as unidades de apoio incluem armazenamento, sanitários, áreas de descanso com redários, áreas de apoio aos feirantes e habitação de interesse social.
a ideia é que sejam instaladas em imóveis subutilizados, a serem ocupados pela Prefeitura (integral ou parcialmente) por meio de instrumentos urbanísticos como incentivos fiscais, outorga onerosa, direito de preempção ou desapropriação.
o objetivo de incluir a habitação, por meio de aluguel social, como parte dos usos das unidades de apoio, tem como objetivo ativar a área central e oferecer condição mínima de moradia às famílias que atualmente ocupam a área do largo do pau do meio e outras áreas em condição de precariedade na região da Feira.
O núcleo da Feira
A proposta de intervenção para o mercado central tem como principal premissa recuperar o protagonismo do pátio e das edificações originais na paisagem urbana e na dinâmica da Feira.
O pátio central, livre das ocupações não originais, passa a ser dedicado a eventos, reuniões, exposições, apresentações musicais, feiras itinerantes e à circulação livre dos feirantes e fregueses.
Os galpões históricos, com suas coberturas em duas águas, telhas cerâmicas, frisos e mãos francesas ornamentadas em madeira, serão recuperados e qualificados para abrigar as unidades de venda que atualmente obstruem o pátio e espaços de circulação e demais usos definidos no programa. As balaustradas serão restauradas e os terraços dos quais fazem parte serão recuperados e qualificados para receber áreas de alimentação e convivência.
Infraestrutura
Além da recuperação das edificações e a desobstrução dos espaços, uma parte essencial da intervenção no mercado se refere à infraestrutura de instalações, necessárias à funcionalidade e à salubridade dos espaços: sistemas de drenagem, esgoto, instalações hidráulicas e elétricas e sistemas de iluminação compatíveis com os usos (novos e existentes) do local.
Qualificação das unidades de venda e permanência dos feirantes
Os feirantes que atualmente têm unidades de venda no mercado serão mantidos no local. As bancas que atualmente ocupam o pátio central serão realocadas para os compartimentos internos dos galpões (“boxes”). Tais espaços – que hoje estão fechados ou subutilizados como depósitos – serão renovados e qualificados, com as instalações necessárias para atender às demandas sanitárias relacionadas ao programa, em especial à comercialização de carnes, vísceras e afins.
As bancas que circundam os galpões do mercado, em geral precárias e sem infraestrutura, serão substituídas por novas unidades (móveis e fixas), com tipologias variadas, a fim de atender às diversas demandas dos feirantes.
As bancas fixas (também em configurações variadas), serão destinadas prioritariamente ao comércio de carnes, vísceras, e outras que demandam instalações específicas (balcões refrigerados, instalações de drenagem, esgoto, água e elétrica, equipamentos de refrigeração, etc).
Nova cobertura
A fim de recuperar o protagonismo do mercado central na paisagem, propõe-se retirar a cobertura metálica existente e substituí-la por tendas coloridas, fixadas por meio de estruturas tensionadas. A nova cobertura, além de trazer luz e ventilação ao pátio central e revelar a arquitetura dos galpões, oferece proteção do sol e da chuva.
Setorização e Programa
A quantidade e a diversidade de temas das unidades de venda existentes serão mantidas na nova configuração, com novas bancas (móveis e fixas), equipadas com a infraestrutura necessária, conforme o uso.
Conexões UrbanasA requalificação do mercado, com a liberação do pátio e dos eixos de circulação permite não apenas reforçar a centralidade do espaço em relação à Feira, mas também contribuir para as conexões urbanas entre as ruas e demais equipamentos e espaços de interesse: armazéns, cassino, edifício e largo do pau do meio.
Vazio preenchido
O Largo do Pau do Meio, apesar da atual condição de precariedade, é um dos principais espaços da Feira de Campina Grande. Os registros históricos já apresentam o largo, desde sua origem, como um vazio preenchido de Feira. Espaço ao mesmo tempo denso e permeável, cuja permanência na memória desafia a efemeridade das precárias estruturas.
Configuração labiríntica e vitalidade urbana
A ideia de largo, em um contexto urbano comum, remeteria à ideia de esvaziamento e de ausência. No caso do Largo do Pau do Meio, a ideia de esplanada e de vazio urbano não faz parte da memória urbana. O vazio sempre esteve preenchido e marcado pela configuração labiríntica, becos estreitos, densidade e vitalidade urbana, como revelam os registros fotográficos e os relatos daqueles que ocupam o espaço há décadas.
Estratégia de Intervenção
Esta proposta de intervenção parte da premissa que o Largo do Pau do Meio deve permanecer como um vazio preenchido de vitalidade urbana: barracas, becos e pequenos pátios, que conduzem feirantes e fregueses por percursos de imersão e surpresas.
Perímetro permeável e eixos de conectividade
Os limites do Largo serão definidos por barracas fixas. Ao mesmo tempo que estabelecem o perímetro, são permeáveis ao fluxo urbano e abrem caminho para os becos, labirintos e pátios.
Pátios: recintos urbanos
Como parte da estratégia de requalificação urbana do Largo, serão criados pátios, que irão se configurar como recintos urbanos definidos pelas barracas fixas e móveis; contrastes súbitos no percurso labiríntico, entre os espaços fechados e abertos.
Espaços de alimentação: peixes, charque e outras especiarias
Os pátios também terão a função de qualificar as áreas de alimentação, que já fazem parte da cultura do Largo do Pau do Meio. Neste caso, a ideia é vincular a atividade de venda de peixes, charque e outras especiarias da região ao consumo de alimentos no local. Essa prática já é observada em outras feiras e mercados no Brasil: o Mercado de Peixes em Fortaleza, em que os frutos do mar adquiridos no mercado são preparados na hora, nas barracas próximas; ou as boieiras do Ver o Peso, em Belém, que preparam o pescado recém-chegado dos barcos que atracam no cais do mercado.
Edifício do Pau do Meio: elemento simbólico e marco vertical da Feira
O edifício do Pau do Meio, por se tratar da única edificação a ser mantida no Largo, pela tipologia e por sua localização estratégica na cota topográfica mais alta, se destaca como elemento simbólico e marco vertical da Feira. Nesse sentido, propõe-se explorar esse potencial por meio da criação de um terraço-café mirante na cobertura do edifício. Tal função, pelo potencial turístico, pode contribuir para a sustentabilidade econômico-financeira da associação e do sindicato de feirantes.
Reservatório: torre de infraestrutura e acessibilidade
A fim de atender à demanda estabelecida no programa do concurso, de reservatório para abastecer o Largo do Pau do Meio e ao mesmo tempo oferecer acessibilidade ao edifício do Pau do Meio, propõe-se a criação de uma torre-reservatório, que além do abastecimento de água, inclui escadas e elevadores que dão acesso ao terraço-mirante.
memória material e imaterial
esta proposta de restauração do edifício do antigo Cassino Eldorado propõe a recuperação e a ressignificação de memórias materiais e imateriais, de ordem sociocultural, tipológica e espacial (edilícia e urbana).
a memória sociocultural do antigo cassino faz referência a eventos que situam Campina Grande como um dos centros de cultura e lazer da região, mas também às contradições sociais do Nordeste e do Brasil. Propõe-se revisitar a história do cassino-cabaré, não simplesmente por meio da exaltação da boemia e da música sob a perspectiva patriarcal dos ricos fazendeiros de algodão, mas por meio de narrativas que também revelem as contradições sociais dos prostíbulos e da condição social feminina – ao mesmo tempo de precariedade e de protagonismo – tanto no Cassino quanto na Feira de Campina Grande.
a memória tipológica e espacial remete ao período de importantes transformações urbanas da cidade, reflexos das novas dinâmicas econômicas e sociais. No caso do cassino, trata-se de uma expressão art déco em transição, em que se mesclam – na arquitetura e no urbanismo – ensaios da vanguarda modernista (ou protomodernista) e expressões da tradição construtiva colonial . Se por um lado já se observa o uso do concreto armado, linhas retas e formas retangulares bem marcadas, platibandas escalonadas, motivo geométricos com funções decorativas, ranhuras e saliências, conferindo simetria, variedade e ritmo às fachadas, por outro lado a sua inserção urbana não altera a aparência do entorno, ao manter os traços característicos da paisagem urbana antiga, além de preservar a volumetria e o sistema de implantação dos edifícios que caracterizam a trama urbana colonial.
estratégias de intervenção
o objetivo principal desta proposta de intervenção é a recuperação da espacialidade do edifício e da intenção modernizadora que marca o período, a fim de permitir novas apropriações do espaço. a condição de ruína do antigo cassino demanda a reconstrução de grande parte do edifício, neste caso a partir de novas materialidades.
seguindo as normas técnicas para áreas de proteção do IPHAEP, a intervenção preserva e restaura a composição tipológica original dos vãos, portas e janelas; preserva e restaura as características estilísticas e ornamentais; preserva o volume e o aspecto formal da edificação. também conforme as orientações do Decreto 33.816, a intervenção evita o mimetismo e o “falso histórico”. para isso, utiliza-se o concreto armado aparente como materialidade que indica as adições e recomposições, a fim de não gerar dúvidas sobre o que é antigo e o que é novo. o concreto armado, neste caso, também faz referência às intenções modernizantes do art déco, mesmo que em várias situações não tenha sido utilizado em sua plenitude, em função das limitações e particularidades técnicas de cada região do Brasil em que o estilo foi utilizado. a madeira é utilizada na reconstituição da cobertura original e nos complementos de estruturas e vedações, quando se faz necessária a afirmação do contemporâneo. para o piso do grande salão, propõe-se o ladrilho hidráulico, elemento característico da arquitetura art déco entre os anos 1930 e 40 e também presente no antigo cassino.
distribuição do programa
a fim de abrigar o programa de necessidades proposto no concurso para o antigo cassino, que prevê a realização de atividades artísticas e culturais relacionadas ao Patrimônio Cultural Brasileiro presentes na Paraíba (espaço museológico e Centro de Referência de Salvaguarda da Feira), propõe-se concentrar as atividades públicas no pavimento térreo, enquanto os espaços administrativos e de acesso mais restrito ocupam o pavimento superior. a edificação que originalmente abrigava o grande salão do cassino passa a abrigar, por sua configuração tipológica, os espaços de exposição permanente e temporárias. o café será instalado no térreo, no fundo do lote, como meio de articulação entre os espaços internos e externos do antigo cassino e sua relação com o entorno urbano, em especial a praça a ser criada no lugar hoje ocupado por estacionamentos.
conexões urbanas
a requalificação dos edifícios que integram o conjunto da Feira de Campina Grande, entre elas o antigo cassino, passa não apenas pela requalificação da arquitetura, mas também a recuperação ou criação de conexões urbanas. a área de miolo de quadra, hoje ocupada por estacionamento, tem um grande potencial nesse sentido. propõe-se que esse espaço seja convertido em praça de convivência com espaços de sombra e mobiliário urbano, paisagismo, redários, estacionamentos de bicicletas e um número reduzido de vagas de estacionamento (sobre estacionamentos, ver proposta de mobilidade na prancha 1)
Conexões Urbanas
A proposta para os armazéns tem como principal premissa estabelecer conexões urbanas entre o Cassino e o Mercado Central e, a partir deste, com o Largo do Pau do Meio e demais ruas da Feira.
O desnível de 5 metros entre a rua Pedro Álvares Cabral (face oeste, mais alta, voltada para o Mercado Central) e a Manoel Pereira de Araújo (face leste, mais baixa, voltada para o cassino) é vencido por meio de planos inclinados em percurso acessível (inclinação máxima de 5%), integrado a um pátio interno.
O pátio: espaço de circulação, cultura e pausa urbana
O pátio interno dos armazéns se configura como uma pausa urbana; um recinto ao mesmo tempo de circulação, descanso e práticas culturais, para onde se voltam os espaços de alimentação (Centro Gastronômico e refeitório da Cozinha Escola)
Tipologias e memória urbana da Feira
Apesar de não se configurar como edificação registrada como patrimônio histórico, entende-se que a preservação da tipologia das fachadas contribui para recuperar a memória urbana da Feira: ruas ladeadas por fachadas, com pequenas aberturas. Parte-se da premissa que a manutenção da configuração tradicional das quadras (ocupação perimetral com vazios no miolo de quadra) contribui para a conformação do espaço da rua, enquanto essência da Feira.
Setorização e Programa
A Cozinha Escola será instalada na área voltada para a Pedro Álvares Cabral e o Mercado Central, no trecho em que os vestígios dos antigos armazéns estão mais presentes. O Centro Gastronômico (praça de alimentação) será instalado na área voltada para a rua Manoel Pereira de Araújo (rua do Cassino), em configuração espacial definida pelo percurso do plano inclinado e a praça interna, que se configura como Pátio Cultural.
Recuperação e reaproveitamento da estrutura existente:
sustentabilidade e memóriaA preservação e recuperação da estrutura existente, onde possível, é uma das premissas da intervenção sobre os armazéns, tanto pelo compromisso com a memória urbana quanto pela economia de recursos e a sustentabilidade. Entende-se que em um contexto de escassez, o reaproveitamento e a renovação de estruturas devem prevalecer sobre a lógica da tábula rasa.
“A grande Feira é o lugar de todos. Expressa, por meio de suas imaterialidades e materialidades, vários espaços e tempos, em sua contínua resistência e atualização de significados…
(…)
A feira tem de tudo. É livre, imprevisível, espraiada a céu aberto. É a recusa ao confinamento em espaços edificados cartesianos, envidraçados e fechados em si mesmos. É rito cotidiano que se faz e desfaz diariamente, que é fugaz e ao mesmo tempo permanente. Cidade-feira contínua, artefato sociocultural e urbano (in)tangível do Agreste dos Sertões. Labirinto de gentes, bichos, coisas e ideias”.
(Dossiê de Registro da Feira de Campina Grande. IPHAN, 2017)
Rua: a essência da Feira
O ponto de partida para a estratégia de requalificação da Feira de Campina Grande é a rua, seu principal suporte material. Nesse sentido, este projeto parte das seguintes estratégias:
– Consolidar as ruas das feiras como espaços exclusivos ou prioritários de pedestres;
– Liberar e ativar as fachadas dos imóveis, atualmente obstruídas pela Feira;
– Eliminar as diferenças de nível entre calçadas e vias e criar calçadões, de fachada a fachada, que se configuram como passeios públicos acessíveis;
– Recuperar e incluir novas redes subterrâneas de drenagem, esgoto e instalações elétricas, adequadas às demandas e funcionalidades das unidades de venda;
– Implantar redes de iluminação pública com instalações subterrâneas
– Equipar as ruas com mobiliário urbano adequado às atividades da Feira e à dinâmica urbana da cidade (bancos, lixeiras, paraciclos, postes, elementos de sinalização, pontos de apoio, banheiros públicos, etc).
Diversidade e adaptabilidade dos suportes
O maior desafio deste projeto é evitar que o exercício de redução da complexidade, tão comum na prática da Arquitetura e Urbanismo, afete a essência e a riqueza da Feira, enquanto patrimônio imaterial. O objetivo, portanto, é qualificar a materialidade e ao mesmo tempo preservar a autenticidade do patrimônio imaterial, que é a Feira. A imaterialidade permanece, enquanto a materialidade perece.
Nesse sentido, busca-se o equilíbrio entre – de um lado – a otimização e racionalização dos espaços, equipamentos e suportes e – do outro – o respeito à diversidade, à complexidade, às irregularidades e dinâmicas naturais da Feira. A resposta projetual a tal desafio é propor um sistema de suportes com tipologias diversas e adaptáveis, que permitam a adaptação às necessidades dos feirantes e às particularidades de cada trecho de rua: bancas móveis com e sem cobertura, estrados simples e com cobertura, barracas fixas de tamanhos variados, estrados com gaiolas, módulos de apoio de dimensões variadas, além de elementos de mobiliário urbano.
Tipologias das ruas
Do ponto de vista da distribuição das unidades de venda e da infraestrutura urbana, as oito ruas atualmente ocupadas pela Feira podem ser sintetizadas em duas tipologias de trechos:
(1) trechos de ruas com largura média de 12 a 14 metros
Trechos com quatro faixas de unidades de venda e dois eixos de iluminação pública.
(2) trechos de ruas com largura média de 10 a 11 metros.
Trechos com duas faixas de unidades de venda e eixo central de iluminação pública.
Nas duas tipologias as fachadas dos imóveis são liberadas, há circulações independentes para feirantes e fregueses, eixos de iluminação pública e mobiliário urbano e infraestrutura urbana subterrânea (drenagem, esgoto, abastecimento e instalações elétricas).
Os elementos fixos, tais como mobiliário urbano, postes de iluminação pública, barracas fixas e unidades de apoio são dispostos de maneira a manter livre (apenas com bancas e suportes móveis) uma faixa de segurança de no mínimo 3 metros de largura para acesso de veículos de emergência.
Quantificação e distribuição das unidades de venda
Uma das principais premissas desta proposta é preservar a quantidade, a diversidade e a distribuição das unidades de venda ao longo das ruas, do mercado e do largo do pau do meio.
A tabela de quantificação e distribuição das unidades de venda apresenta o resumo quantitativo e comparativo (projeto x existente) das ruas, do mercado e do largo do pau do meio, para as diversas categorias de produtos comercializados. No total, serão ofertadas mais unidades de venda do que as existentes, com setorizações similares às originais.
Ficha Técnica:
Concurso Público Nacional de Arquitetura – 2023
Autores: Fabiano José Arcadio Sobreira e Paulo Victor Borges Ribeiro (originalmente como parte do gsr arquitetos)
Colaboradores: Amanda Cintra, Ana Reis, Helena Danik, Luana Alves, Lucas Sousa, Mariana Albuquerque.
